sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

A Primeira do Ano.

Quase que não sai. A terceira edição desse e-zine literário que não é uma revista. Quase que não sai, mas então, sentei, peguei as contribuições, e resolvi colocar no ar essa tal de literatura feita por nós.

Nessa edição conto com poemas de Bárbara Lia e de Hilton Valeriano, que ficou instigado pelo convite a participar do e-zine e me mandou belos poemas seus. Outro que instigado ficou com meu convite e mandou sua colaboração foi o amigo Ismael Angelus, que enviou um conto/relato seu.

Edvaldo Ramos também aparece com uma crônica antiga, mas que, como tudo escrito por ele, deve ser lida.

Agradeço aos companheiros que participam dessa edição, dando um gás para o e-zine continuar. Mês que vem tem mais.

Carlos Alberto Nascimento - Editor do E-zine.

Poema Para o Sono de Marta




Por Hilton Valeriano.

As razões de quem ama
não são argumentos.
Estratagemas para sentimentos
no amor não se pode tê-los.
As evidências de quem ama
são fatos secundários
como as alamedas
no mês de maio.

Os amantes sabem
do improviso
– flor casual do destino.

É possível que o amor seja
mesmo sem a convicção dos teoremas.
Leve – como no sono se propaga
o sonho em Marta.




EPIGRAMA (1)

Marta, para todas as horas possíveis o amor.
Assim o ciclo remissivo das estações
traz à primavera a esperança em flor.


EPIGRAMA (2)

Marta, preciso é o tempo a recobrar sua lição.
Assim a complacência dos gestos e sua missiva.
Circunscrito no horizonte da palavra
o amor é mais que uma definição.


EPIGRAMA (3)

Marta, assim principia o amor:
Inelutável como a aurora,
a luz do Criador.

EPIGRAMA (17)

Marta, não saberia dizer
do amor sua verdade.
Apenas sua condição
e o que desejamos que seja:
dádiva congênere da Natureza!

A lentidão das palavras do arcanjo ao acordá-la.


Por Bárbara Lia.


“A lentidão das palavras do arcanjo ao acordá-la”

O sagrado despe as ilusões
e abraça as árvores mortas
Suas folhas azul esmaecido
qual manto da Virgem de Cambrai

Os ossos das árvores adoeceram
e elas morreram – azuis -
Antes que tornassem brancos
os seus cabelos

“Até que os serafins acenem com seus chapéus brancos”

Não nasci para resfriar o mundo
Neste lerdo cortejo de omissões
Estas palavras interditas
Suspensas

Não vim quebrar as pernas do sol
Silenciar cada bemol
Não vim para arrebentar o anzol
Do velho de Hemingway

Sou mar e trovão no coração
Nasci para amar sem lastro
Para dançar no pátio
It is my way

“Doce como o massacre de sóis”

Oito canhões na praça de guerra
Apontam para o peixe
Que traz a paz nas guelras
Quatro gaivotas suicidas
Lambem o babado azulado
Do triste mar-flamenco
Lembro um filme de Babenco:
Ana e o vôo
Mariposas no quarto lúgubre
Suas mãos em concha
A esmagar a eternidade insalubre


“Dame el ocaso en una copa!”
.
Velhas estradas bifurcadas
Lentas aparições de fantoches
Nas alamedas do nada

Na Academia.



Por Ismael Angelus

Chegando na academia o novo personal trainer vem até mim:

— Bom senhor Angelus, eu atualizei o seu programa que por acaso já deveria ter mudado desde o dia 16 de Dezembro.
— Ãhn, tudo bem.
— Venha comigo, vou lhe mostrar como executar os novos exercícios.

Eis que ele me conduz até um par de halteres pesando juntos possivelmente uns 200 kilos...

— Tome, agora segure-os e levante flexionando dessa maneira.
— Hein?! Você só pode estar brincando comigo!
— Como assim?
— Não tem como eu levantar essa porra! Olha pra mim!
— Qual o problema? Observe, é fácil.
— Claro que é fácil! Você é como o Hulk sem a tinta verde, enquanto eu pareço uma minhoca com AIDS!
— Deixe de bobagem, é claro que consegue.
— Cara, o único jeito de eu levantar isso é se você me arranjar uma lata de espinafre e assobiar pra mim a música tema do POPEYE!
— Acabou a conversa, tome.
Ele me entrega os dois pesos e automaticamente minha cabeça fica mais vermelha que um pirulito de morango.

— Viu como não pesa tanto?
— Essa droga pesa mais que consciência de pedófilo!
— Deixe de reclamar e comece a contagem.
— Um...
— Isso, continue.
— Dois...
— Vamos lá, você vai conseguir.
— Dez... — digo enquanto largo os pesos.
— Negativo, nada disso.
— O que quer dizer?
— Nada de parar em "três".
— Eu parei no dez...
— Não. Parou no três.
— Você deve ter se distraído... Às vezes eu também tenho lapsos de tempo assim, sabe?
— De jeito nenhum. Pode recomeçar.
— Foi a minha ex-mulher quem te contratou para me matar?
— Você já foi casado?
— Graças à Zeus não, mas tive uma amostra do negócio...
— E como foi?
— Digamos que a coisa toda foi quase tão divertida quanto um piquenique no inferno...
— Sinto muito por isso, só que agora acabou a enrolação.

UMA HORA E MEIA DE TORTURA DEPOIS...

- Tem mais algum pra fazer ou já posso ir pra casa e amputar meus braços?
- Não, encerramos por hoje. Amanhã vamos malhar "perna".
- OH MY DOG!

[Essa é a parte em que você depois de ler essa maravilhosa historinha se pergunta: "e como diabos você ainda tem condições de mexer os braços para digitar isso tudo?". Bom, eu não quero me gabar, mas eu e o Kid Bengala temos algo em comum...]


Gêmeos.




Nasceram gêmeos, ligados um ao outro pelo corpo. Na infância um queria brincar com bola, o outro com carrinho. Cresceram então com opiniões diversas, o que um queria, não necessariamente era o desejo do outro.

Na adolescência um apaixonou-se por uma ruiva de cabelos curtos, o outro, por uma loira de cabelos extremamente longos. A loira foi embora, deixando um a sofrer e o outro a lhe enxugar as lágrimas.

Lá pelos trinta, decidiram fazer uma operação para separarem de corpo, pois o convívio já não era tão suportável como antes. Operação feita, cada qual para seu canto, agora eram vidas extremamente divididas.

Mas somente no apartamento vazio, no silêncio pleno onde nenhum barulho era companhia, souberam separadamente que não poderiam viver um, sem a presença e as manias do outro.

Hoje, moram juntos dividindo o mesmo apartamento e o mesmo quarto.

Quem Vigia os Vigilantes






A frase que Alan Moore coloca como a pergunta chave de uma de suas obras primas aqui aparece como uma proposição. Uma sentença que você pode colocar como um apontar de dedos para o clássico culpado pelos males e conflitos do mundo. Desde a destruição das florestas tropicais até às sucessivas e, infelizmente, banais micro e macro guerras que tornam sacais os noticiários. Os assassinatos, a deterioração do intelecto jovem, as desertificações e o aquecimento global, a iminência de uma nova forma de pandemia.


Somos exatamente aqueles que deveriam estar na ativa, perguntando e questionando, forçando a justiça a ser feita, tornando a revolta uma arma, mas também um escudo, pois a revolta consciente, fruto de uma educação consolidada e arraigada em um espírito vivaz e aventureiro, é uma força tão intensa e transformadora quanto a força da água.


O termo “vigilante”, para as autoridades e para o direito penal de vários países, incluindo o nosso, designa cidadãos que tomam para si o dever de exercer e fazer valer a justiça prevista pela Lei vigente no Estado, obrigação do próprio Estado, incumbência exclusiva do mesmo. Em outras palavras, o vigilante é um vingador. Um citadino cansado de esperar que o lento malabarismo das autoridades em achar buracos na Lei cesse, impedindo que tais autoridades achem motivos para não trabalharem. No contexto das noções distorcidas da nossa sociedade, o vigilante é um bandido, passível de ser preso e condenado tal como supostamente o algoz vingado também o é. No nosso contexto, o vigilante é um herói. O único disposto a dar sua vida para fazer o trabalho sujo que ninguém quis fazer enquanto era limpo.

Hoje, tudo está fosco, turvo por uma nuvem de inverdades e maquinações “propagandescas“ manipuladas por não se sabe quem. Talvez o mundo esteja mesmo caindo em um aumento entrópico na busca de desacelerar, um grito final por ajuda, um pedido de socorro. Um mundo precisa de vigilantes, pois eles são as medidas extremas que surgem em situações extremas.Perceba, sempre que uma guerra está para surgir, o mundo passa por uma crise. A crise por territórios nas colônias da África antes da Primeira Guerra Mundial de 1914. A crise de 1929, com a queda da Bolsa de Wall Street pouco menos de uma década antes da Segunda Guerra Mundial. A Revolução Cubana e a caça às bruxas instaurando o medo, somando-se à terrível guerra psicológica taxada pela história de Guerra Fria que culminou em conflitos sangrentos como a Guerra do Vietnã, uma verdadeira luta de Davi contra Golias onde o Davi manteve a tradição da vitória, claro, a seu preço.


Diante dessa possível verdade, o que se pode esperar como fruto do que os jornais nomeiam de crise Econômica Mundial? Não há como saber. Imagino que você, meus queridos, não tenham muita ideia do que possa ter ocasionado a tal da crise, ou sequer entendam por que raios ela quebrou os dois joelhos da nação economicamente mais forte do mundo. Semana passada a Coréia do Norte descumpriu sanções da ONU e fizeram testes com mísseis de longo alcance que tiraram fino no Japão e disseram o que todo mundo sabe ser mentira: “foi o lançamento de um satélite”. Não há satélite algum na órbita prevista na exosfera e nenhum sinal de satélite novo captado pela tecnologia de telecomunicações. Não se pode afirmar nada a respeito do futuro. O futuro não existe. E, como dizem, o passado já não existe mais. O mundo certamente caminha para o caos e o caos tende a aumentar. Só há como tentar ter o poder de controle sobre algo no mundo, na nossa vida se soubermos onde estamos, por que estamos aqui e se nosso contexto realmente precisa de nós. Não há como arrumar uma casa que está no escuro. Precisamos acender as luzes. E a luz do mundo é o pensamento, a virtude, a vontade de excelência, mãe da civilização, a ânsia por fazer bem feito mesmo a tarefa mais simples, mais singela e, aparentemente mais inútil.

Penso que essa excelência que os antigos gregos chamavam de Areté foi substituída por uma preguiça enorme de pensar. Pois quem pensa toma posse do próprio destino. E que tem o controle de si mesmo sabe para onde está indo e reconhece a mentira e a manipulação, luta contra a injustiça, sabe falar, sabe argumentar e facilmente vence guerras e conflitos sem desferir sequer um soco, quem dirá um tiro. Quem sabe pensar não precisa de exércitos, territórios, estratégias bélicas nem armas nucleares. Não é a toa que a censura é o primeiro recurso de uma ditadura. Calar as vozes inteligentes é o caminho mais fácil para o domínio.


A pergunta que lhes faço, tentando não fugir do nosso assunto depois de tantos aparentes rodeios é: “Quem são os vigilantes?”. Há como evitar o mal que possivelmente se aproxima? Eu posso fazer algo para evitá-lo?

O beija-flor, mais uma vez, contraria o leão e importuna as mentes acomodadas e , ao invés de despertar o interesse pela situação do mundo, na busca de torná-lo menos injusto, afugenta-as e separa ainda mais o joio do trigo. Não sei se isso é bom ou ruim, mas preciso tentar.

Só peço, meus amigos, meus queridos, que pensem. Mesmo que ao final de suas reflexões, a escolha seja a de não se importar com o caminho das coisas, com os rumos do mundo. Pensem e busquem pensar mais ainda no sentido de você estar aqui, mesmo que ao final de suas reflexões a conclusão seja a de que não há sentido algum. Porém, entenda que , se não há sentido em estar aqui, é perfeitamente verossímil o poder que você tem de construir um sentido. Pense sempre que, já que você está aqui mesmo, não custa nada tentar ser o melhor. Assuma sua vida e o seu papel. Pois você que o mundo está chamando. Você é o vigilante. Dê um passo a frente e tome posse da sua vida antes que o sistema, os cinzas ou seja lá quem for que esteja por trás de toda a bagunça tome. Construa sua mente, seu pensamento. Construa uma idéia, um objetivo e inclua o mundo ao seu redor nesta idéia. Busque torná-la real e se surpreenderá positivamente com o pouco dela que de fato se concretizar. Vai ver que pode muito mais. Construa seu próprio ser, leia, saiba o que está acontecendo ao seu redor e acredite no efeito borboleta, que uma ação mínima pode resultar numa seqüência de eventos imprevisíveis capazes de transformar tudo. Se não der certo, pelo menos você vai saber que a escolha foi sua e de mais ninguém. E acredite, as pessoas ao redor se lembrarão do herói, não do vigilante.